[Conto] Passou


Esbarrrou na liberdade e disse que não queria nada, pois seria perda de tempo. Há muito mais coisas que fazer enquanto se escrevem esses livros. Afinal, as conversas fiadas de liberdade que cada um constrói nada mais são do que conversas fiadas. E se encontrou no pseudo.

Preocupado se a vida era imagem-tempo ou imagem-movimento, acabou descobrindo ser um plano-americano à la nouvelle vague: perdeu o chão e era meio mudo. Achava que seus olhares já bastavam ao que se chama de necessário para revelar sua psiquê – se é que revelar alguma psiquê é necessário. Foi levando.

Quando da esquina de cá enxergou ele mesmo atravessando a rua oposta, sentiu-se vazio e perguntou para o vento quando foi a última vez que ouviu música prestando atenção na droga da letra. Era aquela maldita letra – nem que ela fosse apenas o dedilhar com delay – que fazia alguma diferença. E aí, cantarolou.

Atendeu o celular, disse que era papo velho, mandou que esperasse, percebeu o sol entre as nuvens, ignorou o outro lado da linha, acionou a câmera e, quando clicou, perguntou de onde vinha a liberdade.

O sol respondeu que estava na esquina passada.

Ricardo Oliveira

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