Ensaio sobre olhares e cegueiras

Ensaio sobre a Cegueira é um tijolão. Isso, certamente, não se refere à sua quantidade de páginas, mesmo que ela seja expressiva se pensarmos no tipo de escrita de Saramago (sem muitos pontos finais e com extensos parágrafos). O peso que tratamos aqui é outro e refere-se às questões reveladas quando uma cidade inteira torna-se cega – exceto, talvez, uma pessoa.

Não é difícil, durante a leitura, entender que o propósito do autor será nos falar sobre como os olhos na verdade parecem se abrir quando deixamos de ver. Que tudo é uma interessante metáfora sobre o que na verdade não vemos em nós. A idéia estará visível (com o perdão do trocadilho) a qualquer um, em poucos capítulos.

Isso, porém, não tira o peso do qual já falamos. Apesar de achar que Saramago em certos pontos excede nas tentativas de gerar os sentimentos extremos em nós, no geral, não é isso que acontece. E, mesmo assim, a situação muitas vezes parece “estar” ali, independente do que Saramago pensa do mundo ou não.

O retrato de uma terra que já não vê, nas mãos do autor, chega tantas vezes a ser vertiginoso, devido à sua escrita de imersão. As palavras não pertecem a um ou outro personagem, mas aos climas – como amariam alguns cineastas orientais – criados a partir delas mesmas e dos olhares (já que Saramago investe tanto nisso). Sim, o livro é narrado o tempo todo por alguém que está vendo tudo acontecer. Não sabemos se é a mulher do médico, Saramago de maneira onisciente ou, até mesmo, Deus – que é tão questionado algumas vezes no livro. Porém, ficamos certos de que o mais importante na leitura já não é mais o relatado por quem pode ver o mundo ao redor.

Ricardo Oliveira,
ao som de Jeff Caylor.

Compare Preços: Ensaio Sobre a Cegueira de José Saramago.