O novo empreendimento de Zack Snyder é o típico filme que está a um passo de ser algo admirável. Não é, mas por estar a um passo de ser, tem sim méritos a serem levantados. Snyder demonstra em Watchmen – O Filme que não é um zero à esquerda do cinema. É certo que em 300 havia pouca coisa importante a ser encontrada. Entretanto, aqui o diretor revela que ainda tendo qualificações modestas no domínio da arte, tem futuro – incerto, mas tem.
Os primeiros dez minutos da produção têm um fôlego empolgante. São trechos enxutos, precisos e que demonstram logo de cara um interesse de Snyder em criar espaço para o espectador criar suas próprias interpretações. Refiro-me ao foco do diretor em subverter certa lógica dos filmes de herois, inserindo a trilha sonora certeira nos momentos inesperados. Ora, quem aguardava uma briga ao som de Unforgetable na voz de Nat King Cole ou a ótima sequência de créditos iniciais com Bob Dylan?
Rorschach é de longe o personagem mais interessante no filme, numa produção que sofre justamente pela ausência do protagonista por essência. A história gira ao redor de todos e ao mesmo tempo de nenhum, o que se torna um equívoco grave no cinema, considerando que trata-se de uma adaptação de uma minisérie de quadrinhos (que tem tempo o suficiente para desenvolver bem cada um dos personagens). Como lembrou Filipe Furtado, o problema de Snyder é justamente demonstrar o mínimo interesse em pensar o cinema ao invés de apenas produzí-lo.
Watchmen não consegue transmitir que realmente acredita em seus personagens, já que no modo como foram apresentados, terminam por não funcionar na tela. Suas vestimentas, seus dizeres ressoam fragilmente e se diluem em poucos segundos na mente. O único que parece permanecer, pela qualidade do ator e por estar mais próximo da realidade (sem roupas exageradas e com uma máscara genial), é justamente o Rorschach. Lembremos aqui dos procedimentos de Bryan Singer na adaptação que gerou a estética dos herois de X-Men e X-men 2: nem toda fidelidade ao original é sábia para as telas. Deste modo, nada mais sensato que transformar o uniforme do Wolverine em algo menos exagerado e, ainda assim, usar o personagem metalinguisticamente para brincar com a nova farda. Salvando o fato de que a história se passa nos anos 80, a direção de arte pouquíssimas vezes trabalha para que isto seja lembrado com frequência. O que faz das roupas de Ozymandias, Especral, Coruja e do visual de Dr. Manhatam algo bastante esdrúxulo – simplesmente não faz sentido para o público adulto, ao qual o filme, pretensiosamente, parece tentar alcançar.
O máximo que Snyder consegue exprimir de marca pessoal para além da fidelidade à obra original é justamente sub-aproveitado. O gore, a violência, o estardalhaço de sangue passa rápido demais, quando poderia determinar uma releitura específica e própria do diretor. O resultado final é quase uma catástrofe e, ao mesmo tempo, quase satisfatório. Watchmen, portanto, é apenas mediano.
Ricardo Oliveira
Observação: depois de toda confusão que rolou sobre a exibição do filme na Sala 6 do Box Cinemas, além da pressão realizada pela imprensa paraibana, a gerência do lugar traz Watchmen para a Sala 5 nesta sexta-feira. Aproveitem e assistam o filme em scope gigante e audio de alta qualidade.