Primeiro dia da mostra competitiva de curtas.
Cotações de zero a 5 estrelas.
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Refletir sobre o carnaval sem incorrer em falsas epifanias como “por alguns dias as pessoas podem ser o que elas quiserem” era o verdadeiro desafio do curta da diretora Ana Costa Ribeiro. E aquele foi apenas um dos muitos clichês que prejudicaram sua boa proposta: a de narrá-lo sob a perspectiva de alguém que volta ao país depois de uma temporada no exterior. Por outro lado, o filme cativa com suas imagens de arquivo – elas sim captam a poesia que as entrelinhas do texto deixam escapar.
Popokas (SP)
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Sua estética publicitária e humor nonsense renderam a plateia, simpática a um tipo de linguagem predominante em alguns “vídeos do minuto” exibidos antes da mostra. Detalhes como a placa “Gerundismo não!”, na central de telemarketing, e o diálogo entre os protagonistas, num francês de bistrô, são fruto de um roteiro às vezes previsível, mas cheio de boas ideias.
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Aqui o que há são boas intenções. A animação quer passar a mensagem de que o planeta precisa ser salvo e só será com a cooperação de todos. Entendemos a mensagem, percebemos o seu valor, mas a didática amordaça o curta com uma paródia um tanto canhestra de “A Velha a Fiar”.
Garoto de Histórias (PB)
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“Fazer história” é o código usado por um dos garotos entrevistados para combinar seus programas em público, ao telefone. Documental, o filme peca por sua montagem, que intercala os depoimentos dos garotos com imagens de dançarinos da noite. Os efeitos aplicados a estas imagens não servem de incremento estético, mas incomodam por seu ar rudimentar e por causar um fetiche inoportuno em torno do universo da prostituição. É uma sutil incoerência diante do tom geral do curta, que tenta recuperar a dignidade de personagens à margem da sociedade.
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Outro tema delicado, o estupro, ganha contornos ficcionais nesta produção que seduz por sua atmosfera p&b, pelo seu silêncio e por suas imagens carregadas de sentido. A associação entre a caneca e a banheira transbordando é intrigante e tensiona a narrativa, repleta de sugestões.
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O curta em 3D de Marcio Kakuno é gracioso, porém ingênuo. Nada contra as animações, mas esta não era, definitivamente, a noite do gênero.
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Há quem faça samba na caixinha de fósforo. Dérreis, figura folclórica do sertão de Patos, discípulo de Jackson do Pandeiro, faz numa lata. Tipo de curta que ganha por seu personagem central: falastrão, mulherengo, Derréis conquista qualquer público.
O Muro (PR)
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A confusão com o homônimo pernambucano, premiado em Cannes ano passado, gerou uma certa decepção ao final desta história. Nela, dois garotos separados por um muro se divertem jogando uma bola um para o outro. “E assim nasceu o vôlei”, sugeriu alguém da plateia. Se não suscitou uma boa crítica, suscitou uma boa anedota e por isso já deve ser considerado.
Série. EM. Série, Histórias que se Repetem (BA)
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“A rotina é como as páginas de um livro: sozinhas podem não dizer nada, mas juntas nos contam histórias”. A premissa é boa, mas o filme foge dela à medida que algumas das (poucas) histórias contadas vão se prolongando e cansando o espectador. O transitório, que está bem trabalhado no caso do operador de fotocopiadoras ou do caixa de supermercado, não está tão bem delineado no caso do açougueiro e do vendedor de rua.
Um Conto de Solidão (SP)
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Pros que gostam de finais surpreendentes que justificam rodeios narrativos e conduzem o espectador a um destino que não é exatamente aquele que ele esperava.
éliaOFF (PB)
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A videodança encanta por sua coreografia subaquática e pela originalidade dos takes, que fogem dos planos mais óbvios. Não chega a esmiuçar o corpo tão bem quanto “Súbito”, outro raro exemplar de um gênero que nos chegou através das sessões do Assacine, mas essa talvez não tenha sido a intenção do curta, cujo atrativo visual está mais voltado para a poética de gestos e movimentos.
A Medida do Quilômetro (PB)
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Louvável como registro etnográfico da comunidade quilombola, mas frágil como documentário. O epílogo explicativo do curta é dispensável, e nada melhor que os aplausos antes dele para indicar isso. Uma obra que se explica ou cai na redundância ou deixa patente o grave problema de não se sustentar sem uma pista para o espectador, que fatalmente se sentirá subestimado.
1500-Circular (PB)
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O ônibus é o set de filmagem deste curta que acompanha o dia a dia de motoristas, cobradores e passageiros da linha circular que atravessa 23 bairros da capital paraibana. A câmera é precisa desde o seu embarque no coletivo, quando o flagra acima de sua lotação, num típico fim de tarde pessoense. Este recorte, porém, dá lugar a outro mais prosaico e o filme perde a oportunidade de lançar um olhar sobre o problema do transporte público da cidade.
Após um tempão acompanhando a saudosa Dulce Damasceno de Brito na SET e Isabela Boscov na Veja, eis que viro leitor de Tiago Germano!
Gostei do formato com comentários que apesar de breves, objetivos, dão uma idéia bem clara dos filmes em análise.
Isso sem mencionar esse jeitão agridoce de opinar, que já vale a leitura, hehehehehehe…
Parabéns, cara.