Filmes hitchcockianos – via Revista Paisà

Nas Garras do Vício (Le Beau Serge, 1958), de Claude Chabrol

Os Primos (Les Cousins, 1959), de Claude Chabrol

Claude Chabrol co-escreveu com Eric Rohmer o primeiro estudo crítico da obra de Hitchcock e toda a sua obra não deixa de ser marcada pela sombra feita por Hitchcock e Fritz Lang. Nos seus dois primeiros filmes, porém, esta influência surge de forma menos direta com o cineasta aplicando de forma prática a idéia de transferência entre dois personagens que ele e Rohmer discutiram a partir de filmes como Pacto Sinistro.

Charada (Charade, 1963), de Stanley Donen

Stanley Donen realizou vários thrillers farsescos que praticavam um auto-consciente pastiche de nosso cineasta inglês favorito. Indiscreta e Arebesque são confeitos divertidíssimos, mas o melhor deles com certeza é este Charada com Cary Grant e Audrey Hepburn muito inspirados. Alguns anos atrás Jonathan Demme reimaginou Charada como um pastiche de nouvelle vague (completo com ponta da Agnes Varda) apontando que por trás da sua superfície paródica, o filme de Donen estava bem mais próximo das apropriações francesas do mestre do que muitos imaginavam.

Moscou Contra 007 (From Russia with Love, 1963), de Terence Young

É irônico que apesar de odiar espionagem, Hitchcock tenha influenciado de maneira decisiva os filmes de James Bond, e por conseqüência todos os seus imitadores, que beberam direto na fonte de Intriga Internacional. Moscou Contra 007, o melhor dos Bonds com Sean Connery, tem até a sua versão da famosa cena em que Cary Grant é perseguido por um avião. Depois, Hitchcock daria o troco realizando alguns dos melhores filmes de espionagem que se posicionavam de maneira crítica ao olhar dos filmes de 007 sobre o tema, tais como Cortina Rasgada e Topázio.

Blow Up – Depois Daquele Beijo (Blow Up, 1966), de Michelangelo Antonioni

De certa maneira o filme de Antonioni é mais impressionante como um retrato de Londres no meio dos anos 60, mas sua gênese e trama derivam do mesmo tipo de questão sobre a imagem que ocasionalmente transparece nos filmes do inglês. Blow Up não apenas gerou diversos outros filmes (Prelúdio para Matar, Um Tiro na Noite), como marcou diretamente uma parte do discurso crítico sobre a influência de Hitchcock em filmes subseqüentes.

Encurralado (Duel, 1971), de Steven Spielberg

Se alguns dos filmes da lista têm uma abordagem mais cerebral e desconstrutiva sobre a influência do cineasta, esta estréia de Spielberg chega a ele de maneira direta e visceral. Um filme agressivo como poucas vezes em sua carreira e talvez passados todos estes anos permaneça seu ponto alto.

Perversa Paixão (Play Misty for Me, 1971), de Clint Eastwood

A estréia de Eastwood na direção é uma versão mais estudada da mesma abordagem. Cineasta que valoriza a clareza e muito mais próximo da escola Hawks/Ford do cinema americano, Eastwood realiza aqui um thriller em que trabalha com firmeza sobre o artifício e demonstra ter aprendido com o inglês como transformar a ação de thriller em exploração psicológica dos seus personagens.

Celine et Julie Vont en Bateau (1974), de Jacques Rivette

Como seus companheiros de Cahiers du Cinema, Jacques Rivette sempre teve prazer de especular a partir de filmes do cineasta inglês. Entre todos os filmes dessa lista Celine et Julie é de certo o menos obviamente hitchcockiano, mas esta fantasia sobre duas amigas que se transformam personagens/espectadoras de um drama vitoriano é não só um dos melhores filmes sobre cinema, como um exercício em duplos e voyeurismo em que a influência do mestre é inegável.

Trágica Obsessão (Obsession, 1976), de Brian De Palma

O melhor filme de De Palma parte de um roteiro de Paul Schrader que é um grande pastiche de Um Corpo que Cai, mas o cineasta chega a ele a partir de uma grande apreensão das possibilidades melodramáticas de material. Manipulando-o como um mestre capaz de compreender que melodrama é similar a condução de uma orquestra. Não surpreende que tenha contratado Bernard Herrmann para produzir a trilha sonora, e a musica do compositor se torna tão central ao filme que ele termina se revelando seu verdadeiro co-autor.

Halloween (1978), de John Carpenter

Como bom aluno aplicado John Carpenter se aproveita de anos de estudo sobre jogos de perspectiva e manipulação do espectador para construir um dos mais simples e assustadores filmes de terror de todos os tempos.

Vestida para Matar (Dressed to Kill, 1980), de Brian De Palma

De Palma dirigiu alguns filmes hitchcockianos de impacto emocional bem maior do que este Vestida para Matar, mas aqui estão algumas das suas seqüências mais impressionantes e a forma como reconstrói suas fontes a partir de uma perversidade e vulgaridade bem próprias é sempre marcante.

Sem Sol (Sans Soleil, 1982), de Chris Marker

A certa altura deste grande filme ensaio, Chris Marker faz uma peregrinação até San Francisco à procura das locações usadas em Um Corpo que Cai. Ao apresentar suas próprias imagens próximas aquelas do filme que tanto maravilha-lo, Marker consegue um efeito tão assombroso quanto o de Um Corpo que Cai.

De Repente, Num Domingo (Vivement Dimanche!, 1983), de François Truffaut

Este último filme de Truffaut – realizado como um verdadeiro testamento – incluí tudo o que o cineasta ama em cinema, o que claro não poderia deixar de contar com Hitchcock. De todos os vários filmes em que Truffaut flertou com seu mestre este é provavelmente o melhor justamente por ser o mais simples e direto deles.

Duble de Corpo (Body Double, 1984), de Brian De Palma

De tempos em tempos, geralmente após o fracasso de uma grande produção, De Palma se dedica a fazer um pequeno e delicioso filme vagabundo onde parece procurar a essência da sua filmografia. Depois da má recepção de Scarface, veio este Duble de Corpo, onde mais do que qualquer outra obra do cineasta se combina cenas, motivos e às vezes mesmo simples imagens de diversos filmes de Hitchcock. Paradoxalmente, o resultado final não poderia ser mais Brian De Palma.

Especiais Efeitos (Special Effects, 1984), de Larry Cohen

Eric Bogosian interpreta o cineasta decadente que assassina sua atriz sem talento diante das câmeras e depois procura uma sósia para construir um filme em torno do material. Esta homenagem de Cohen a Um Corpo que Cai pode se concentrar num cineasta picareta a procura do filme realista perfeito, mas é um dos mais impressionantes mergulhos no artifício de todo o cinema.

Masques (1987), de Claude Chabrol

Este é um belo exemplar de Chabrol trabalhando numa chave menor e prazerosa. Um filme dirigido de forma mais relaxada pelo cineasta, mas sempre tenso para o espectador que acompanha a relação entre um famoso apresentador de TV (Philippe Noiret) e um escritor contratado para escrever sua autobiografia, ambos com motivações bem diferentes do que suas posições sugerem.

Comando Assassino (Monkey Shines: Experiment in Fear, 1988), de George Romero

Não deixa de ser interessante observar que quando resolveu deixar de lado seus filmes de horror com fundo político e realizar um thriller cujo subtítulo original é “experimento em medo”, Romero tenha se voltado para Hitchcock. Como Halloween, Comando Assassino é um filme que assimila perfeitamente a gramática do inglês; e como Encurralado, Romero a aplica para uma impressionante montanha russa visceral. È um dos filmes mais superficiais do cineasta, mas um dos mais prazerosos também.

Do You Like Hitchcock? (2005), de Dario Argento

Argento flertou muitas vezes com a obra de Hitchcock antes de fazer este thriller cômico todo previsto na familiaridade do espectador com filmes como Pacto Sinistro e Janela Indiscreta. Argento mistura ainda mais filmes de Hitchcock do que Duble de Corpo, e no processo parece ter reencontrado um prazer em filmar que não víamos na sua obra desde Terror na Opera (87). O filme foi realizado para TV, mas é dos trabalhos mais cinematográficos do mestre italiano.

Déjà Vu (2006), de Tony Scott

Parte Um Corpo que Cai, parte Laura, o thriller de Tony Scott é uma belíssima atualização do romance fantasmagórico. A grosseria das imagens de Scott o torna um cineasta bem pouco indicado para um filme como esse, mas é também ela que torna o filme essencial. Assim como Duble de Corpo fizera em meados dos anos 80, Dèja Vù não é o Um Corpo que Cai dos sonhos dos puristas, mas é aquele que se encaixa com exatidão em seu tempo e é muito mais bonito por conta disso.

En La Ciudad de Sylvia (2007), de José Luis Guerin

O filme de Guerin é sobretudo uma celebração do prazer sensorial de olhar, mas sem deixar de ao mesmo tempo colocar este prazer do espectador em questão. Central neste processo é uma longa seqüência de perseguição – mais de vinte minutos – que é descendente direto das cenas em que James Stewart segue Kim Novak em Um Corpo que Cai.

Fim dos Tempos (The Happening, 2008), de M Night Shyamalan

Já houve muitos filmes pós-apocalipticos seguindo a lógica de Os Pássaros, mas poucos exibindo o cuidado e o comprometimento em levar seu ponto de vista a única conclusão possível. E poucos cineastas filmaram esta idéia de colapso de civilização de maneira tão direta quanto Shyamalan.

Seleção e Texto: Filipe Furtado

FONTE: Revista Paisà

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