Crítica: “Duplicidade”, por Ricardo Oliveira

Clive Owen e Julia Roberts

Em Duplicidade o diretor Tony Gilroy colhe os frutos de outro filme. Não trata-se de plágio e talvez nem de uma homenagem, mas estão lá pontadas de O Plano Perfeito, de Spike Lee. Isso, entretanto, longe de ser apenas porque um dos protagonistas do filme de Gilroy também está no outro filme. Estamos falando de algo mais amplo. Antes, uma breve descrição: Clive Owen e Julia Roberts são dois agentes secretos (ele inglês, ela americana) que se apaixonam e passam a viver um jogo de desconfiança e desencontros. Sabemos disso tudo através de flashbacks, já que os dois estão, agora, trabalhando na segurança de empresas concorrentes, cujos donos são Paul Giamatti e Tom Wilkinson.

De O Plano Perfeito, Gilroy nos traz a inspiração a um formalismo dedicado enquanto diretor, levando a disposição dos atores em cena à níveis dos quais a Hollywood de hoje em dia está pouco acostumada. Ou seja, um simples posicionamento diferente em cena, produz outra significação do que vemos na tela. Parece simples, mas por ter sido exaustivamente usada de forma inadequada, são poucos os que conseguem fazer disso uma virtude. Na prática? Basta lembrar da cena na qual Julia Roberts entrevista uma empregada da empresa onde está infiltrada: toda a postura da atriz à cadeira é o suficiente para entender o que ela está sentindo. Mas, como se não fosse o suficiente, ainda temos o seu olhar preciso. Isto tudo, obviamente, sem depender da amarra que poderia ser a oralidade. Se tudo já está ali, sem “falar” nada, pra quê mais?

Mas nem só de acertos vive o filme de Gilroy. Ele nos leva a caminhos menos óbvios durante toda a exibição, mas erra gravemente ao escolher o meloso para representar a relação de amor entre os personagens. Música romântica demais tocando de forma inesperada, quando nada (se pensarmos o trabalho de trilha sonora do filme) indicava para isso. Não seria grande problema se depois de tantos jogos inteligentes com o espectador, tudo não fosse encerrado com uma tacada um tanto cruel na brincadeira das pistas falsas. Erro comum nos filmes que se propõem a “enganar” quem os assiste: entrar no beco sem saída cuja única possibilidade é quebrar o beco inteiro e assustar quem estava ali por perto. A última cena, entretanto, após a descoberta um tanto canalha, compensa todo erro. Gilroy então não põe tudo a perder, considerando todo o seu trabalho primoroso, mas chega bem perto.

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