Crítica: “Trama Internacional” por Ricardo Oliveira

Há uma verdade importante sobre Trama Internacional: Tom Tyker sabe fazer seu filme funcionar. E conseguir esta proeza, numa produção de enredo complexo como esse, é uma virtude a ser divulgada. Tyker já havia conseguido surpreender seu público com Corra, Lola Corra, em seus “três universos paralelos”, mais ou menos baseados numa ideia de efeito borboleta dos fatos e escolhas. Aqui, sem sacadinhas que possam chamar mais atenção para elas mesmas do que para a história em si, o diretor acerta em cheio na realização de um thriller de investigação.

É possível afirmar que o primeiro plano do filme, abrupto como chega aos espectadores na sala, não deixa de ser uma síntese de diversos fatores importantes sobre como receber Trama Internacional. Temos um close no rosto de Louis Salinger (Clive Owen), que observa atento alguma coisa. Porém, o plano é demorado para um filme que no trailer promete até um bocado de ação. Planos demorados incomodam, especialmente de um close de rosto intrigado, pois revela muito pouco. Essa escolha, entretanto, pode ser um guia para o espectador. Em termos de história, não haverá nada de tão complexo no filme que exija um olhar demorado (a não ser sua forte carga política para reflexão posterior). Mas há em certas escolhas de Tyker, em pequenas entrelinhas que surgem nos elos entre as cenas, que exigem de nós um olhar mais atento para o que podem significar, o que podem dizer além do que já é óbvio.

Mas há em certas escolhas de Tyker, em pequenas entrelinhas que surgem nos elos entre as cenas, que exigem de nós um olhar mais atento para o que podem significar, o que podem dizer além do que já é óbvio.

Em certo momento da história, Salinger, agente da Interpol, precisará confirmar uma informação no banco que ele está investigando. Conversando com seu parceiro de trabalho, é alertado sobre o fato de que sua agência não é responsável por executar a lei, mas apenas por investigar. Certos caminhos ele teria de percorrer sozinho, pois a agência não se responsabilizaria por isso. Diante do gigante que é o banco, perto do confuso e com passado estranho Salinger, o agente passa a ser uma formiga. Isto é evidenciado de forma bela na próxima cena. Nada exatamente original em termos de signifcação das imagens no cinema, mas sua colocação foi perfeita.

O prédio do banco é enorme, suntuoso e espelhado. Na frente, uma longa escadaria. Salinger sobe este caminho sozinho e pela disposição arquitetônica do lugar, dois enquadramentos clássicos evidenciariam a mesma coisa. Um contra-plongée (enquadrar Owen de baixo para cima) mostraria a grandeza do banco, sua magnitude; um plongée (enquadrar Owen de cima para baixo), entretanto, é o escolhido. Porém, um plongée quase total (90 graus) e extremamente aberto. Num único plano, é possível fazer o que precisaria de dois ou de um movimento de câmera exagerado, para trazer o mesmo efeito. Tyker mostra Owen como aquela formiga já anunciada no trecho anterior. As paredes externas do banco são vidraças espelhadas: a instituição não deixa de ser um reflexo de algo já comum e existente no mundo. A escadaria é o monte que Salinger tem de subir para encontrar com seu opositor direto no filme: o dono do banco. A curta jornada o leva para uma das melhores cenas do filme, que não pretendo revelar aqui para evitar spoilers.

As simbologias no filme de Tyker continuam e estão em todo filme. Descidas ao subterrâneo, subidas para pontos mais altos onde há um pouco mais de justiça, reflexos e imagens dentro de um museu em Nova Yorke. Tudo evidenciando que, para assistir Trama Internacional, além de estar preparado para uma paulada emocional por toda tensão que ele consegue passar (sem canalhices meticulosamente montadas), precisa-se de um olhar demorado e atento para usufruir das suas entrelinhas. Aproveite enquanto os pipocões das outras salas não o engolem. Está em cartaz na Sala 3 do Box Cinemas e Sala 01 do Cinemultiplex do Tambiá, em cópias legendadas.

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